A dança do coração

por Renata Kindle

Quando estamos dançando é uma oportunidade que damos ao nosso corpo para que ele fale. Embalado por uma melodia, ele expressa as nossas emoções, as nossas crenças, o nosso olhar para o mundo, para o outro, para nós mesmos.
Dançar é permitir-se levar, por alguns instantes, é permitir-se a liberdade do espírito. O corpo balança, gira, movimenta-se lenta ou rapidamente. Os movimentos vão ficando mais soltos, mais desprendidos, mais desapegados e o corpo vai se tornando mais leve, menos aprisionador da alma que, naqueles minutos, ganha o espaço, expande-se e fica verdadeiramente livre, vai aonde quiser estar.
Não é necessário ser um dançarino profissional, um estudante aplicadíssimo, apenas feche seus olhos e ouça a música (ela pode tocar apenas na sua cabeça, não se acanhe por isso), apenas sinta-a e deixe seu corpo responder, deixe que ele se movimente como quiser.
Tem momentos pra dançarmos separados, livres, soltos, mas há aqueles que queremos dançar junto, dançar coladinho, dançar valsa, dançar, sentir a música, deixarmo-nos levar. É um momento e momentos fazem uma vida, escrevem uma estória. Há dias pra dançar forte, dias pra dançar leve, suavemente deslizar, mas sempre sentir.

Algumas pessoas são rígidas, seus movimentos parecem golpes de luta, mas aos poucos, na medida em que se permitem, vão se soltando, vão se desprendendo e então sua dança fica perfeita.
Na vida, somos assim também. Rígidos em alguns momentos, arraigados em nossas crenças e convicções, mas precisamos ouvir a música que vem de nosso coração, deixá-la tocar e nos tocar. Precisamos permitir aos nossos corpos que acompanhem tais sinfonias.
Quando nos prendemos muito ao racional, quando nosso mental se põe ferrenhamente entre nosso coração e nossa ação, quando ele passa ser o mediador entre a nossa música e a nossa dança, então ficamos descompassados, condenados a uma rigidez que pode nos custar muitas danças perdidas, inacabadas ou simplesmente sem música, sem par.
Claro que é importante pensar, é necessário, inclusive. Claro que temos que medir consequências, mas saber a sutil diferença entre o que realmente desejamos viver e o que queremos de imediato, o que é dançar sua dança ou copiar a coreografia de alguém, o que pede o seu coração ou o que é a imposição do seu ego, que reduz as possibilidades de uma vida autêntica, de uma dança emocionante.

As decisões do coração não são tomadas com a nossa parte que pensa, isso nos assassina! São tomadas como se decide o próximo passo, o próximo rodopio, a próxima pirueta. Não é a cabeça que lida com o amor! Não há balança nem nenhum outro instrumento que o mensure. Decisões do coração tomadas com nossa máquina pensante nos divide, desagrega e nos diminui.
Quando permitimos que o coração decida, a resposta vem como segredo revelado, como véu que cai do rosto. O coração é nossa parte mais sincera e o que ele deseja é simples: um amor que seja seguro, uma mão onde a sua encontra pouso certo, um abraço que o aconchegue, a risada despretensiosa para uma piada qualquer ou o conforto para nossa dor, transformando nossa lágrima em pérola, nossa solidão em companhia, nossa vida em vida. Um amor que nos eleve, que nos faça crescer, que nos motive a sermos melhor para com o mundo.
Decisões do coração avaliadas em pesos e medidas, em equações sistematicamente analisadas e pior, precocemente, apenas nos trarão dor e sofrimento. O arrependimento não tardará.
Quisera eu não ter decidido, quisera eu olhar aqueles olhos outra vez! As decisões são importantes para quem quer prosseguir. Quando uma porta se abre, não devemos ficar parados, é preciso sabermos para onde ir e a melhor maneira de não errar, é seguir a voz interior, aquela que vem do coração. Quando você decidir atravessá-la, sua vida será coroada de momentos felizes, seu coração repousará e finalmente pulsará junto com outro.

Texto revisado